Há perguntas que parecem eternas. Uma das mais conhecidas é: o que veio primeiro — o ovo ou a galinha? Do ponto de vista científico, os ovos existiam antes das galinhas. Do ponto de vista religioso, Deus teria criado a galinha já formada. Já para os filósofos, trata-se de um paradoxo que ilustra a complexidade entre causa e efeito.
E se aplicarmos esta lógica à SATA? O que veio primeiro: os prejuízos ou as más decisões? Foram as rotas deficitárias que arrastaram a companhia para a ruína, ou foram as administrações que, ao insistirem nessas rotas, provocaram os prejuízos? O atual presidente da SATA disse recentemente que a empresa foi usada como “barriga de aluguer” para servir certo tecido empresarial açoriano. Mas, olhando para os resultados, a companhia não serviu os empresários, nem os açorianos, nem o seu acionista: a Região Autónoma dos Açores.
A realidade é dura: a SATA Internacional (hoje Azores Airlines) apresenta uma imagem cada vez mais degradada. Com uma frota insuficiente, atrasos constantes, frequentes avarias e falta de planeamento, ninguém está satisfeito. Isto não se aplica à SATA Air Açores, que continua a garantir, embora com imensos atrasos e dificuldades, os voos interilhas. A crítica recai sobre a parte internacional da operação, que se tornou um sorvedouro de recursos públicos.
A explicação oficial para os prejuízos aponta para as “rotas deficitárias”. Mas isso não chega. É preciso ir mais fundo: qual foi a taxa média de ocupação dos voos? Quanto custou manter essas rotas? Quanto se gastou com manutenção, fretamento de aviões (os chamados ACMI), com pessoal, com indemnizações e más decisões?
Em 2024, o Grupo SATA teve um prejuízo consolidado superior a 82 milhões de euros — dos quais 71,2 milhões só da Azores Airlines. E mesmo assim, os gastos com pessoal subiram mais de 10 milhões de euros. Como se justifica isto numa empresa tecnicamente falida? Qualquer gestão responsável teria seguido o caminho oposto: contenção, reorganização, cortes cirúrgicos. Em vez disso, aumentaram-se vencimentos e agravaram-se os custos operacionais.
Este tipo de decisão de aumentar ordenados em mais de 30% numa empresa pública falida não podia passar impune. A censura política não é suficiente neste caso. É necessário repensar a legislação para responsabilizar criminalmente quem gere o dinheiro público com negligência ou má-fé. Se isso implicar que administradores, ex-autarcas ou ex-governantes respondam judicialmente, que assim seja. A democracia também se protege com responsabilidade.
Casos como o do avião A330 “Cachalote”, ou o empréstimo obtido junto do Goldman Sachs com juros superiores a 30% — que custaram 6 milhões de euros em juros num só ano — são inaceitáveis. Mostram um padrão de má gestão, impunidade e desrespeito pelos contribuintes.
A SATA tornou-se um símbolo daquilo que o Estado não deve gerir. E os Açores continuam reféns de uma visão estatizante da economia. O governo regional fala de privatizações, mas não privatiza quase nada. E quando o faz, é apenas para tentar livrar-se do que já não tem valor nem solução como a Sata Azores Airlines. Os partidos que se opõem à privatização de empresas públicas “lucrativas” esquecem que essas empresas devem ser privatizadas antes de se tornarem deficitárias — e não quando já ninguém as quer comprar.
Quantas mais empresas públicas falidas teremos de sustentar até que a própria Região entre em colapso financeiro? Quando perceberemos que a gestão política, sem responsabilização, está a empurrar os Açores para um beco sem saída?
No fim, ficará um novo paradoxo — talvez mais grave do que o do ovo e da galinha: foram as empresas públicas mal geridas que afundaram a Região, ou foi a Região, ao insistir nelas, que destruiu as suas próprias finanças?
Talvez seja mesmo necessário que venha uma Troika para os Açores, não só para nos salvar, mas para nos explicar onde e quando tudo começou a falhar.
Francisco Lima
Deputado e Vice-Presidente do CHEGA Açores




